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A Poetisa do Castelo

Recentemente encontrei alguns escritos que julgava perdidos. Fiquei muito feliz em ter encontrado este, feito há uns 9 anos atrás, para uma amiga e companheira de versos: Débora Pereira

A poetisa do castelo está debruçada na janela da torre…

…Cansada das liras e danças,
Entediada com as tiras e nuanças
Retirou-se para os seus aposentos.

Ali acariciada pelo sol de tíbios raios
Fica entre a vigília e do sono o desmaio
A acalentar sabe-se lá que tormentos.

Ela anseia mas não fala.
Ela sofre mas não chora.
Ela quer… Mas a vontade resvala…

…Pelos dedos de sua mão…

Ela sonha com enredos que lhe cobrem de alturas.
Ela morde o lábio com os segredos da clausura.
Ela busca a lábia da serpente e os olhos do dragão.

Mas de tudo o que seu espírito verte
Quem teria o valor de ser intérprete?

Pois sua mente repleta de personagens e estranhos
Povoa o seu quarto de espíritos tamanhos
Que apavorariam o mais nobre guerreiro.

E fantasioso e feérico o seu cantar,
Mas mesmo assim só faz desesperar
Aquele a quem este toma por herdeiro.

Canta do triunfo do demônio,
De visitações em sonho
Que tudo fazem abismar.

Canta das lendas do açoite
Que gritos solta na noite
De atormentados a desvairar.

E ai! Canta do amante que em cinzas
Povoa o sonho mas não alisa
As linhas de sua (e)terna mão sem par.

Pois este castelo de festa e bulício
Tornou-se barulhento presídio
Para o seu espírito em amplidão.

E agora prisioneira da alma o suplício
Vê-se enclausurada no solstício
De um inverno além de toda imaginação.

É o frio de trovadores bêbados e estúpidos.
É o nada de reis gordos e tacanhos.
É o gelo do eterno prazer tépido.
É o desabrigo de toda sorte de sorriso esquelético.

E enregelada abriga-se e vai agora para o além profundo do seu interior…

A poetisa do castelo está debruçada na janela da torre
Mas em sua alma ela está diante do penhasco.
Barganhou por asas que toquem a lira de quem ouve
Mas não implorou por ouvidos não dissonantes como o aço.

O seu mergulho para o espírito
É uma viagem ao mar do eterno suicídio.
As pedras na morte não a amparam
E não morrendo chora as ondas que a afogam.

Ir de encontro ao seu destino
É justamente permanecer no limite.
Pois em sua vida há dois abismos:
O da porta que se fecha e da janela que se abre.

A porta tranca para fora os monstros que festejam
E a janela abre a jaula das quimeras que no seu interior habitam.

Mas haverá um dia que, como Ismalia, ela não vai aguentar.
Vai confiar em suas asas e vai querer para o espaço se alçar!

Vai subir no batente da janela
E fazer o que seu espírito anela:

Lançar o seu corpo para a Terra
E seu espírito para o Ar!