I-Cotidiano (a quota de um ano)
Eu sou um demônio cansado
E cansado sigo.
Queria ter um amigo
Mas só tenho o meu C.D.
Eu sou um humano comum
E comum me desligo.
Queria ter um abrigo
Mas só tenho o meu apê.
Eu sou um animal covarde
E covarde me obrigo.
Queria conversar contigo
Mas só conversa comigo a T.V.
Eu sou um homem calado
E calado te digo
Que este terno e esta gravata com os quais estou vestido
Fazem com que os outros não consigam me ver.
Eu sou um deus como qualquer um
E como qualquer egocêntrico consigo
Ficar sozinho sem o perigo
De ninguém me submeter.
Eu tenho dois controles remotos.
Eu tenho um amor remoto.
Eu tenho um remoto pensar
De que estou vivo em algum lugar
E em algum lugar te digo
Que te amo e queria estar com você
Mas alguém desligou a T.V.
O C.D.
E você!
Turn Off!
II-O estranho no apartamento
Eu tenho uma coleção de noites sem sonhos.
Gostaria de ver?
Eu tenho uma galeria de dias repetitivos.
Quer conhecer?
Eu tenho uma porção
De mundos virtuais
Na minha recordação!
A criança-e-suas-mitologias cresceu!
A criança-e-seus-livros-de-história cresceu!
Já é um homem!
E hoje os vermes o consomem
Esperando retornar ao pó!
Você pode me ouvir?
Tem alguém aí?
Há alguém aí, fora dessas quatro paredes?
Ou acima deste teto?
Ou abaixo desse chão?
Sabe o que é, não queria te importunar,
Mas é que o concreto
Do meu coração
O colocaram mal.
E eu sinto umas coisas estranhas!
Li em livros que se chamam tristeza e solidão,
Mas ninguém as conhece
Pois nas suas entranhas
Dizem do sangue ser gelado!
Sabe o que é,
Eu não queria te importunar,
Mas queria que você descesse aqui
Pra gente se abraçar!
Só uma vez!
Só uma vez…