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Considerações

Reflexos – parte iii


Parte I
Parte II

III

Tomar um barco e navegar…
Tão vasto é o mar!
Porém só nos interessa aquele pedaço:
Em que, na proa, como se fitando o espaço,
Olhamos para baixo tentando compreender
Àquela criatura ondulante,
Àquela imagem como que enclausurada n’água,
Como que enclausurada num mundo tão distante.


Parte IV
Parte V
Parte VI
Parte VII
Parte VIII
Parte IX
Parte X
Parte XI
Partes XII e XIII (final)

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Considerações

O Jardim – parte ii


Parte I

II

Deste jardim
Somos o sonho do verme que busca na terra seu alimento.
Ele diz – “Alento!” –
E passa por entre as raízes das flores
Enquanto sabores
Contém na mente
Vazia de cores.
Por isso, labores
Coloca nas costas
Impregnada de odores.

O verme sonha com um lugar para se descansar…


Parte III
Parte IV

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Apokolips

A carne arremessada sobre o leito

A carne arremessada sobre o leito.
Olhos fixos no nada
Enquanto as veias quase secas
Empurram coágulos pelas suas galerias.

O desejo do fim da dor
Se confunde com o desejo da morte
E do descanso eterno
Enquanto os órgãos lutam para trabalhar.

Tanta vida e tão pouca vontade!
O moribundo jaz sobre o leito.
Sua vida se irmana com sua morte:
A busca do fim da dor.

A doença, depositada na alma,
Estende suas garras sobre o coração
E tapeado pelas imagens do sono
Não notou o seu avanço.

Mas ele ainda pode ter os olhos fixos no espaço
E cego vislumbrar as imagens que o enganaram.

Fama, Fortuna, Glória e Clamor,
Belas mulheres em langor,
Vírus da sua ilusão,
Súcubo do pensamento.

E sessenta e cinco anos foram necessários
Para se levar o moribundo do nada ao nada.

Sessenta e cinco anos de doenças e pequenos incômodos,
De trabalhos e feridas,
De estudos e desalentos,
De humilhações e sofrimentos,
De bebedeiras e afagos,
De traições e paixão doentia,
De desencanto e tédio,
De apodrecimento e falha,
De ascensão e glória,
De esforço e preocupação,
De desespero e dúvida.

Sessenta e cinco anos de crime, castigo e aspiração,
De auto flagelação e sonho,
De sonhar e cair,
De cair e se levantar,
De levantar-se e se apoiar nos espinhos,
De perfurar-se e cicatrizar,
De cicatrizar e adoecer,
De adoecer e se curar,
De curar-se e morrer,
De morrer e morrer de novo

Todos os dias até o pó.

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Considerações

Reflexos – parte ii


Parte I

II

É um teatro longo
Num país distante.
A longevidade é a metáfora do tédio.
A distância é a imagem da introspecção.
E nos jogos feitos diante do reflexivo cristal
Refletimos sobre reflexos refeitos em honrarias
E memórias tardias
Que se perdem nesse mar de cristal.


Parte III
Parte IV
Parte V
Parte VI
Parte VII
Parte VIII
Parte IX
Parte X
Parte XI
Partes XII e XIII (final)

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Suave coisa, suave coisa nenhuma

Eu sei que de todos os dias

Eu sei que de todos os dias,
Da tua gestação foram os que o Criador mais cuidou.

Esmerar-se em ti seria o mínimo para Deuses:
Pele de seda, olhos de mel,
Corpo onde se figura toda a beleza que já se desenhou.

Eu sei que, de todas as formas,
Da tua é que um Anjo se adornou.

Adornar-se de ti seria o mínimo para Anjos:
Alma de cristal, coração de luz,
Asas que abraçam tudo que já se sonhou.

Eu sei que, de todas as pessoas,
Da tua é que meu Coração se apaixonou.

Apaixonar-se por ti seria o mínimo para Corações:
Gentil como a brisa, carinhosa como a relva,
Abrigo único e meu inestimável amor.

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Considerações

O Jardim – parte i

Das contas que fiz,
Dos mares que naveguei,
Chamo de novo,
Enfadonho,
Austero,
Súplice,
Mártir,
Esse espírito arredio
De feras ferinas
Nascido em meio ao torvelinho
De heras feridas

Que se espalhavam pelo jardim em meio ao marginal obscuro enquanto doces flores cresciam e sorriam ao nascer do sol!

Injustiça!
Que ervas venenosas tenham menos direito
Que flores formosas!

Injustiça!
Que orlas receosas tenham menos alento
Que amores sob árvores frondosas!

No entanto
Se o espinho que sulca a terra
Não conhece o escarro do verme
Não é espinho!
Não conhece o mistério do sol!
E o poder das trevas!

Por isso
Que as ervas venenosas cresçam
Na escuridão
Que é o seu lar
E que as flores do campo sucumbam
Na luz sem razão
Que é o seu fadar!


Parte II
Parte III
Parte IV

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Interlúdio

Procura

Sombras forjei no tempo
Enquanto escondido em meio ao vento
Chamava por teu nome!

Nas noites frias
De vidas vazias
Essa procura me consome.

Vi teu semblante
Perdido em meio à luz.
Passou rápido, porém fulgurante,
E os meus olhares não te fizeram juz.

Olhei para o alto
Após recobrar a visão
E sofreu um repentino assalto
Meu coração

Ao ver que não estava mais lá!

Desde então teu nome chamo
E me uni à solidão!
Percorrendo trevas tua presença clamo!

Me ajoelhei em meio ao deserto
E chorei!
As areias nas minhas mãos
Aprisionei!

E libertei
Tanto sentir aflito!
Tanta busca sem sentido!

Deixei as aves noturnas voarem,
E se pararem,
Será longe daqui!

Uni tua força
E te conquistei!
Te tirei da forca,
No entanto, já sei:

Somos estranhos inconciliáveis
Habitando a mesma alma!
Somos criaturas insondáveis
Partilhando a mesma culpa!

Somos irmãos de sangue
Desprezando como a vida soa!
E – não se zangue –
Somos a mesma pessoa!

Partiram minha alma em pedaços
E o sentido se foi!
Cortaram-me os braços
E lutar já não posso!

Mil, dois mil, milhões
De esgares e vomitares
De nada!

Dezenas, centenas, infinitas gerações
De reconciliares
De sombra!

Mil, dois mil, milhões
De gemeres
Enquanto estamos contra

Nós mesmos…

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Considerações

Reflexos – parte i

O caderno sempre será o meu espelho.
Eu me coloco de fronte à ele
E espero que me diga
Aquilo que quero ouvir.
É aqui que me desnudo,
Que me toco,
Que conheço a minha alma.
Não conheço nenhum meio melhor de se ver
Do que se colocar de fronte ao espelho
E encarnar a imagem.


Parte II
Parte III
Parte IV
Parte V
Parte VI
Parte VII
Parte VIII
Parte IX
Parte X
Parte XI
Partes XII e XIII (final)

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Suave coisa, suave coisa nenhuma

Espero a tarde

Espero a tarde
Como se ela fosse o meu lar.
Espero a tarde
Como se não houvesse o que mais esperar.

Espero
Porque a tarde vem cheia de esperanças,
Espero
Porque a tarde tem promessa de fragrâncias.

Tarde.
Alguns dizem: antes tarde do que nunca
Mas essa tarde tarda tanto
Faz com o tempo brincadeira maluca

Tarde:
Na beira do precipício te espero
Sentado a cismar sobre todas as sinas.
Eu caminhei muito e agora farto fico aqui
A contemplar o horizonte esperando e esperando.

A espera é tudo o que me resta.
Quero seus tons vermelhos de final de festa.
Quero o céu ensangüentado sem uma única fresta

De azul onde o nada possa contemplar.
O azul do dia não me interessa
Nele não há nada que possa me amparar.

Esse é o desejo que no meu peito arde!
E não há outra coisa que o possa apaziguar!
Vai! Morram Tempo e Espaço!
Deixem de me torturar!

Quero apenas a tarde!
Porque quando esta tarde chegar
Desfazendo todo o meu embaraço
Minha amada há de descansar

    Nos meus braços…

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Tédio

Grilhões os forjamos todos os dias

Grilhões os forjamos todos os dias,
E, em meio a tantas monotonias,
Quem afirmaria que é insensatez?

Nas regras do desregrado viver
Se quebra em pedaços de sôfrego prazer
Quando o orgulho se enaltece como parede
E nos cerca impedindo a saciedade do coração a sede.

E jogando os jogos das gravatas e honrarias
Seguimos as nossas conclusões precoces ou tardias
Pois a palavra se prende aos músculos
E o desejo nos produz Súcubos.

Olhares nos fazem esmorecer a vontade,
Ocultamos nossa alma atrás da mediocridade
E dizemos “Bom dia” com a morte estampada no rosto.

O tédio profundo provoca desgosto
Mas a fome de nada nos faz levantar toda manhã
E as palavras açucaradas nos fazem sorrir ao afã.

Mais dia, menos dia, nosso corpo fenece.
A dor é a única que cresce
Enquanto na corrupção do espírito
Há muito já não se dorme tranqüilo.

“Vá lá e sorria!”